Palhaçadas nossas, que estais em Portugal
Palhaços e suas graças… vá entender u.ú
Um artigo de Alberto Gonçalves, que desempenha no Observador o papel de bobo da corte, ou de palhaço residente, seguido do comentário de Carlos Quartel, o comentário de que mais gostei e um dos mais apreciados.
Como tristezas não pagam dívidas rir ainda é o melhor remédio!
Cartas de amor
de uma esquerda portuguesa
Antes do final do mês é plausível que milhares de “personalidades de esquerda” se juntem em dúzias de peditórios. À esquerda não faltam “personalidades”: falta noção do ridículo e falta vergonha.
Por Alberto Gonçalves no Observador às 00:23 de 08 de Janeiro de 2022. Original aqui.
A 2 de Janeiro, 31 “personalidades de esquerda” rogaram por petição “o entendimento das forças de centro-esquerda e esquerda, visando constituir uma maioria parlamentar e um Governo [maiúscula deles] que tenha como propósito a aplicação de medidas indispensáveis para a melhoria do bem-estar da população”. No dia 4, foram 100 as “personalidades de esquerda” a reclamar “uma maioria plural de esquerda” nas eleições, visto que, “seja qual for o futuro, só essa pluralidade pode construir o diálogo, a alternativa e a resistência”. Escrevo a 7, e estranho que ontem 350 “personalidades de esquerda” não tenham produzido apelo similar. Mas antes do final do mês é plausível que milhares de “personalidades de esquerda” se juntem em dúzias de peditórios. À esquerda não faltam “personalidades”: falta noção do ridículo e falta vergonha.
Uma coisa de cada vez. Primeiro, a ironia. É interessante notar que os apelos à união das esquerdas nem sequer conseguem unir os esquerdistas que assim apelam. É evidente que a acumulação de abaixo-assinados traduz ódios ou pelo menos divergências entre os respectivos subscritores. Dado que Fulano não aprecia Sicrano, não o convida para o grupo dos eleitos (“eleitos” é força de expressão), o que motiva Sicrano a redigir um texto alternativo e a convidar Beltrano. Naturalmente, Beltrano detesta Fulano e cinco integrantes da “lista” de Sicrano, pelo que, com 185 “personalidades” despeitadas, já iniciou a sua própria carta aberta, a publicar logo que o “site” do “Expresso” ressuscite. E o prof. Boaventura assina as cartas todas.
Depois vem a soberba. Conforme a designação indica, as “personalidades” não são quaisquer palermas: são palermas que se julgam ungidos de um estatuto especial, atribuído pela política, a universidade (digamos), o cançonetismo, o “jornalismo” ou as “artes”. Aqui não se encontram cantoneiros, operadores de “telemarketing” ou despachantes, ofícios “normais” que não habilitam o titular a orientar-se sozinho e muito menos a influenciar o próximo. As massas brutas carecem de orientação. Por sorte, acima delas paira uma elite esclarecida generosamente disponível para orientá-las através do exemplo. Se a sra. dona Pilar del Rio, cuja sabedoria é infinita, vota em marxistas, não cabe na cabeça de ninguém que o Zé Luís, bancário na Trofa, arrisque fazer diferente. E se o sr. Abrunhosa, que comete uns discos, deseja que os marxistas preencham por completo o parlamento, seria absurdo que a Isabel de Sousa, pasteleira em Ourém, discordasse. Igualdade sim, mas com limites.
Por cá, os comediantes profissionais, em geral de esquerda, em geral possuem a graça de uma torradeira avariada. Em compensação, os comediantes acidentais são genuinamente engraçados. A lengalenga dos 100 chega a referir a necessidade de “alternativa” e de “resistência”. Alternativa a quê, santo Deus? Resistência a quê, virgem santíssima? Esta tropa fandanga é a pura representação do “sistema”, naquilo que o “sistema” tem de mais bolorento e daninho. Gostem ou não (gostam, gostam), em larga medida eles são o poder, que miseravelmente ocupam desde 2015 e espantosamente acumulam com a devoção infantil, e algo macabra, do Maio de 1968, dos barbudos cubanos ou dos próprios sovietes. Ainda que usufruam de privilégios vedados a uns 98% dos restantes portugueses, mantêm o imaginário da “luta” com a extraordinária convicção de um vegetariano que vai na segunda dose de cabrito.
Do alto da alucinação e do grotesco, da presunção e da pompa, estas petições e peticionários têm genuína piada. Só perdemos a vontade de rir quando, sob o humor involuntário, nos lembramos de que a influência e as intenções desses bandos são os maiores sintomas do nosso imenso atraso de vida. Dito de outra maneira: estamos em 2022. E após todas as proezas do comunismo assumido ou dissimulado, um pequeno país castigado há décadas pela doença colectivista, e pela pobreza, o autoritarismo e a corrupção anexas, continua a admitir que a pertença à “esquerda” constitui sinal de orgulho e distinção. É como se, por cima do rasto de destruição e morte, a peste bubónica gozasse até hoje de razoável prestígio. Quando vejo uma criatura confessar-se de esquerda, imagino-a sempre a proclamar: “Sim, de facto considero que a acção de luta e resistência da bactéria Yersinia pestis é o único caminho para a consagração do ser humano na sua plenitude.” E se lhe lembramos a devastação, a resposta não falha: “Essa não era a peste verdadeira”.
Loucura, no sentido exacto do termo? Evidentemente. Porém, é injusto acreditar que loucos são apenas os consumidores dos sucessivos “manifestos”, e não os oportunistas que os assinam. Mesmo os oportunistas não parecem regular bem, e a transformação da maluquice num negócio rentável não confere alta automática aos malucos. Para lá do oportunismo, do cinismo e da hipocrisia, acho sinceramente, e com imenso respeito, que a vaidade dos esquerdistas com a esquerda que afinal escolheram reflecte psicoses graves. Nada ali se prende com a aflição face às desigualdades (que aliás praticam) ou as opressões (que de resto exercem), e sim com o mero prazer de se dizerem “de esquerda”. A palavra enche-lhes tanto a boca que a última sílaba solta-se pelas narinas, feito mostarda. Tamanha “superioridade moral” não disfarça a inferioridade emocional, alimentada por obsessões, tiques, transes.
As ladainhas dos 31, dos 100 e dos 589 destinam-se ao público em geral. Deviam ser endereçadas ao corpo clínico do Júlio de Matos. Embora assinem inúmeras cartas, as “personalidades de esquerda” não jogam com o baralho todo.
O comentário de que mais gostei
A irritação do autor é manifestamente exagerada. Eles estão somente a zelar pelo seu bem estar, a fazer o que podem para que ninguém os incomode , nos seus modos de vida.
Todos, ou quase todos, estão sentados na mesa do orçamento, nos seus observatórios, entidades, comissões, recebendo bolsas para investigações de género, de raça, de escravatura, de tipos binários, fazendo doutoramentos e mestrados sobre as ciências da adivinhação e outros temas fundamentais para o desenvolvimento da espécie, coisas que não estão ao alcance das mentes tacanhas da direita, que poderiam cortar a torneira de onde saem os euros que os sustentam.
Há que compreendê-los .....
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Carlos Quartel, há um dia, aqui.
FIM